Mistérios da oração, por Suzel Tunes
Mistérios da oração
Muito se fala sobre oração. Existem até encontros e cursos específicos sobre adoração e intercessão. Mas a oração ainda é um tema envolto em mistérios, dúvidas e incompreensões que, ficam, muitas vezes, ocultas por nossa timidez, por nossos condicionamentos culturais e teológicos e até por nossa falta de reflexão. Sabemos realmente orar? O Expositor Cristão teve um bate-papo com o bispo Nelson Luiz Campos Leite, criador do Disk Oração. De maneira franca e tranqüila, ele falou como pensa e sente esse privilegiado meio de relacionamento com Deus.
Como você define oração?
Na minha experiência pessoal, oração é um estado de intimidade e comunhão com Deus através do qual expressamos nossa adoração e sentimentos diante do Pai, em nome do nosso Senhor, Jesus Cristo.
Se Deus sabe do que necessitamos, por que pedimos? Não deveríamos apenas agradecer?
É uma questão que há séculos têm levado o ser humano a refletir. O próprio Jesus quando diz para entrarmos em nosso quarto, em silêncio, demonstra o fato de que Deus sabe as nossas necessidades. Então, por que orar de forma intercessória? Creio que isso revela uma confiança em Deus, nossa disposição de receber uma orientação de Deus a respeito das coisas que estamos buscando e deixar Deus agir em nosso interior, confirmando ou modificando a nossa perspectiva. Tiago (cap.4, v.3) diz ....”pedi e não recebeis, porque pedis mal, para esbanjardes em vossos prazeres” e não segundo os critérios da nova vida.
A oração altera circunstâncias ou eventos da vida humana?
Tomo como exemplo um texto do teólogo Rubem Alves no qual ele diz que, ao contrário da maioria das pessoas, ele não ora ao entrar em um avião. Diz ele: “Se rezar adiantasse, aviões não cairiam, porque há sempre alguém que faz o sinal-da-cruz quando o avião arranca para a decolagem. Por que caem aviões? Por que as rezas não foram suficientes? (...) Não rezei. Para não perder o respeito por Deus. Eu não respeitaria um Deus que só salvasse os homens que constantemente o chamam ao telefone”.
Orar no avião dá segurança à própria pessoa que ora... É, na verdade, um amparo para si mesma. Creio que Deus pode agir de forma até sobrenatural, mas sem ferir a sua soberania e os propósitos básicos de sua natureza e Reino. Existem dezenas de situações concretas nas quais a oração promoveu mudança, transformação, cura. E outras centenas em que o que se buscava não ocorreu, mas Deus agiu de outra forma, preparando mentes e capacitando a enfrentar a situação. Ele nunca deixa de responder.
Mas o que dizer, por exemplo, a uma mãe temente a Deus que pede a cura para um filho e não tem o seu pedido atendido?
Mesmo no contexto evangélico, existe uma consciência determinista que coloca nas mãos de Deus todos os acontecimentos, dando-lhe a responsabilidade por tudo o que ocorre. Na verdade, somos seres criados à imagem e semelhança de Deus, a quem foi dada a liberdade de escolha e a responsabilidade por tudo aquilo que optamos. Creio que a maioria dos males individuais, familiares e sociais existem não por determinação de Deus, mas por equívocos da escolha humana. Em geral, uma enfermidade tem histórico que pode ser genético, congênito ou fruto de uma situação de vida. O fato de Deus não curar uma pessoa não significa negação, abandono ou distanciamento de Deus. Não há ninguém que sofra mais do que Ele, junto de nós. Mas de uma forma acima de nossa compreensão ele permite determinadas coisas que para nós são absurdas e não as entendemos.
Diante do sofrimento de uma mãe que perde um filho, o que mais precisamos fazer é mostrar nossa solidariedade e amor cristãos num momento em que a pessoa está cheia de perguntas e vivendo uma crise existencial muito séria.
Deus entende que a pessoa questione. Na sua natureza de graça e amor, ele não reprime o ser. Isso é parte da oração e é uma forma terapêutica de Deus agir. E nas enfermidades nas quais o âmago é psicológico, com reflexos físicos, os resultados da oração são tremendamente evidentes. A importância da fé no tratamento é comprovada. A maior cura é a interior. Plenitude em saúde é viver a vida em abundância.
A teóloga Suzanne de Dietrich (1891-1981) era uma pessoa de espiritualidade impressionante. Sofria de graves problemas físicos, de ordem congênita. As pessoas lhe perguntavam: “Você não ora pedindo cura?” Ela respondia: “Com toda essa minha limitação, eu me sinto plena”.
Oramos muito pedindo saúde e, nos últimos tempos, em que cresce a violência urbana, também por paz. Vemos muitos “atos proféticos” nos quais se ora pela paz diante de uma bandeira ou mapa da cidade, estado ou país. Será que existe a consciência do significado simbólico desse ato, ou acredita-se que o ato profético seja um escudo ou“cobertura espiritual” capaz de proteger o local indicado pela bandeira?
A fé não pode ser no “ato profético” em si, não se trata de um ritual mágico. O uso da bandeira ou mapa do local deve tão somente simbolizar a entrega a Deus e também a nossa disposição em sermos agentes contra a violência, nos manifestando profeticamente contra algo que contraria os princípios do Reino. E nos dispondo a colaborar com Deus para que a paz se construa por meio das pessoas, família, instituição, políticos.
Deus tem poder ilimitado para agir. Ele tinha poder para evitar tudo o que ocorreu com Cristo. Podia agir com seus anjos, com sua própria autoridade, mas não agiu assim. Muitas coisas Deus permite que ocorra para chamar o ser humano à responsabilidade.
Existe a idéia de que “Deus ouve de maneira especial a oração das crianças”. Da mesma maneira, há membros de igrejas que fazem questão que seu pastor ou alguém que julguem mais “espiritual” ore por eles. Esse pensamento não pressupõe algum tipo de mediação entre Deus e o ser humano? Ou a existência de algum “mérito” para que a oração seja ouvida?
Quando se buscam crianças, líderes, pastores(as) ou grupos para a prática da oração é muito mais no sentido de apoio, da segurança, amizade e solidariedade que a pessoa precisa naquele momento. Não existem mediadores entre Deus e o ser humano a não ser Jesus Cristo. Ele que é nosso intercessor, na presença do Espírito Santo. E Deus não age segundo nossos méritos, mas segundo a sua infinita misericórdia. Assim, ele ouve todas as pessoas da mesma maneira. Creio na compaixão divina e na avaliação de Deus da sinceridade de nossa busca confiante. Podemos nos achegar com confiança e expor a Deus os nossos desejos, mas, sempre, oferecer o resultado a Ele, para sua honra e glória.
Mas por que existem tantos cursos e encontros de intercessores hoje em dia? Jesus já não nos ensinou a orar, quando nos disse para orarmos sem alarde e vãs repetições e quando nos ensinou a oração dominical? (Mateus 6.5-15)
Quando tem fundamentação bíblica séria, correta, o “curso de intercessão“ pode nos ajudar em nosso relacionamento com Deus. Intercessão é parte da oração, mas é a parte final do processo da adoração. Como temos tantos equívocos hoje em dia quanto à oração, eu creio que é importante refletir, estudar e agir corretamente.
PARA SABER MAIS:
Livros:
Amizade com Deuspelos meios da graça, do pastor e professor metodista José Carlos Barbosa. Neste livro, o pastor explica a visão wesleyana dos “meios de graça” (oração, jejum, leitura da Bíblia, participação da Ceia, confissão de pecados, serviço cristão e vida em comunhão) canais de transmissão da graça divina ao ser humano. Coleção Cepeme, Equilíbrio Editora. Tel. (19) 3435-5300, Piracicaba, SP.
Em nome do Pai, de Larry Crabb, Editora Mundo Cristão: o teólogo e conferencista norte-americano fala do relacionamento pessoal que deve existir entre o Pai Eterno e seus filhos e filhas. Informações e vendas: www.mundocristao.com.br, tel (11) 2127-4147.
Decepcionado com Deus, de Philip Yancey, Editora Mundo Cristão: o pastor e escritor norte-americano busca analisar, à luz da Bíblia, a questão do sofrimento e da dor. “O autor mostra como, muitas vezes, nossas súplicas são tentativas inconscientes de encaixar Deus nos parâmetros da nossa inteligência limitada. Então, incrivelmente, nos decepcionamos com Deus por não se submeter à nossa vontade”, comentou a senadora Marina Silva, uma das leitores desse livro.
A Cabana, de William P. Young, Editora Sextante: é uma obra de ficção, que se tornou um best-seller nos Estados Unidos e agora no Brasil. Mack, que perdeu sua filha, vive em tristeza, rancor e dúvida: se Deus é tão poderoso, por que não faz nada para amenizar o nosso sofrimento? Em um surpreendente encontro numa cabana na floresta, ele terá a sua resposta.
Série Quando, vários autores, Editora Cedro: quinze temas trabalhados de forma simples e direta, a partir das necessidades percebidas pelo Disk Oração: luto, perda, depressão, família, crise etc. Livraria Cedro, telefone (11) 3277-7166. Desta iniciativa nasceu o projeto do “Áudio-livro”, que tem sido desenvolvido pessoalmente pelo bispo Nelson.
Suzel Tunes
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